quarta-feira, abril 10, 2019

Prólogo...Guacira Maciel


O ensino e a aprendizagem surgiram nas diversas sociedades como uma consequência natural da necessidade de sobrevivência das espécies, pela transmissão do conhecimento construído. Assim, o currículo surge como necessário à organização desse conhecimento a ser repassado e como reflexo da função social da escola, uma vez que nele estão fortemente presentes as relações de controle social, relações de poder e reprodução de valores que influirão na constituição dos sujeitos e suas identidades. Ele é o elemento dinâmico da proposta pedagógica, devendo ser entendido como espaço de conflitos que estruturam a vida da escola e como tal, um currículo precisa ser democrático, acolhendo as relações e abrindo-se à produção de significados próprios da comunidade onde ela está inserida, de forma a recriar uma proposta pedagógica dinâmica, cuja linguagem inclua o olhar divergente, para produzir resultados satisfatórios, já que deve estar ligado à como se estabelecem as relações de ensino e de aprendizagem dentro dessas realidades.
Dessa forma, a proposta curricular não pode ter um modelo imposto, uma vez que é um elemento vivo e, portanto, provisório quanto à sua temporalidade, passível de ser revista e mudada, de forma a que possa incorporar novos saberes, novas experiências e uma compreensão ampla e contextualizada de mundo e das culturas que ampliam e fortalecem as identidades. Importante estar alerta para não se perpetuar como um refém das leis, mas estar à sua frente oferecendo uma educação de vanguarda, que possa refletir as novas dinâmicas sociais, as tensões que demandam de uma sociedade mutante e a diversidade dos sujeitos; e só então buscar seu referendo.
Entretanto, para que isso possa ocorrer será necessário que reflita a forma de sentir e pensar dessa juventude que vive na contemporaneidade, cujos pressupostos encaminham para a compreensão de se aliar a cultura ao trabalho, tendo como princípio educativo um conhecimento que o conscientize quanto às formas reais deste, inclusive a possibilidade de introduzir aí, a diversidade, uma vez que, concordando com Miguel Arroyo, o mesmo tem gênero e tem raça (se sabemos que o padrão é racista); tudo isso a partir de um conceito lúcido do que seja juventude ou juventudes, como premissa.
Sabemos que a participação do sujeito jovem na dinâmica social não é vista nem avaliada de forma ampla quando são propostas as políticas de educação. É fundamental que outras dimensões do seu estar na vida, o seu universo simbólico e emocional, não apenas a sua vida funcional, sejam incluídos, de forma a que essas representações sejam mais legítimas e seu contexto cultural possa ser reconstruído e representar seu modo de viver e pensar.
Em muitas culturas existe uma tendência de se realizar estudos em que as questões do jovem(s) são olhadas apenas como dilemas, o que termina por apresentá-lo(s), tão somente, como um problema a ser encarado pela sociedade; um problema para o qual há que se buscar solução; predominantemente quando se fala em adoção de políticas para abertura do mercado de trabalho ou econômicas de um país, ou mesmo, busca de formas para incorporá-lo(s) aos sistemas de ensino, o fenômeno é sempre observado nessa ótica, o que tem trazido como conseqüência, a ausência, em suas vidas, de oferta de conhecimento e oferta de outras possibilidades; de bandeiras e de sonhos.
Para que isso possa ocorrer será necessário que se mude essa dinâmica e o(s) jovem(s) possa(m) ser ouvido(s); é importante que se possa entender o seu universo; como pensam e como gostariam de se expressar; assim, considero da maior importância que o professor conheça quais os possíveis caminhos que o conduzem à aprendizagem; quais caminhos subjetivos são percorridos, desencadeados pelas profundas mudanças fisiológicas, psíquicas, conflitos emocionais, rejeição à autoridade, ao próprio corpo, posicionamento quanto à sexualidade, à necessidade de decidir sobre o futuro, para que a aprendizagem se efetive, vez que é nesta fase que é obstado a definir para si um caminho profissional; por todas estas, entre outras motivações, se torna extremamente difícil lidar ao mesmo tempo, consigo mesmo, com os outros e com o mundo.
Em que pese já existirem muitos trabalhos de educadores e pensadores sobre a forma como se traduz o significado político e cultural de juventude(s) e considerações do que é ser jovem(s), ela deve ser vista e analisada de maneira bastante oxigenada e livre, se sabemos que os desejos, as necessidades e a incorporação de novos conhecimentos são especialmente dinâmicos e mutáveis; aberta e sem amarras ou preconceitos, vez que nenhum desses conceitos é rígido e deverão existir momentos específicos para que se considere um ou outro, pois precisarão ser consideradas questões vitais, como: situação sócio/econômica; origem étnica; questões de gênero e religião, além de todas as vivências citadas acima. Entendo de fundamental importância sejam observados os momentos em se deve levar em conta o fenômeno “juventude” no singular e/ou no plural; entretanto, o seu universo, seja como for, precisa ser considerado de forma mais abrangente, apontar para a dilatação dos seus horizontes e estimular a utopia.

Do meu livro: "A arte como possibilidade do desenvolvimento cognitivo"


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