Esta pesquisa compunha, originalmente, o romance "Cruz do meu rosário: um amor na Chapada", mas foi retirado pela autora, e encontra~se em outra obra.
Não foi encontrado nenhum registro documental que comprove que esse
ilustre personagem da Corte Portuguesa tenha sido, de fato, um ascendente da
família de Marta, mas, além do retrato a bico de pena nostalgicamente pendurado
numa parede do palacete sede da fazenda, já bem mais velho que as reproduções
posteriormente encontradas em pesquisas, tão vivo na memória de Isadora,
apaixonada pelo assunto, consta em relatos orais de tios e antigos empregados,
que a história do parentesco é verídica. E mais, em gerações posteriores da
família, existem alguns descendentes homônimos, como uma espécie de homenagem
póstuma ao famoso personagem.
Também não foram encontrados na pesquisa realizada, documentos que
registrem sua passagem pela Bahia e nem sua permanência no Recôncavo Baiano a
ponto de ter tido algum relacionamento que tenha lhe dado herdeiros, nem que
tenha sido proprietário de um engenho de cana de açúcar...
Entretanto, essa história é tão cheia de elementos e de fatos coerentes,
que passou a ser aceita pela parte mais velha da família que viveu na região,
no período posterior àquele. Vejamos:
Entre o período em que esteve no auge de sua atuação como navegador, prestigiadíssimo
pelo rei D. Manuel, e sua desgraça por razões políticas - já que o rei morrera
e seu sucessor se deixara influenciar por intrigas, e é sabido que ele foi
acusado de cuidar mais de seus interesses pessoais do que das questões do reino
- e consequente prisão e morte, há um hiato de longos anos. Onde estivera, uma
vez que sua experiência como navegador era vasta e de comprovada competência?
após exaustiva pesquisa nos registros através da Internet e documentos de
historiadores, não foi explicado o seu paradeiro depois de ser solto, até sua
morte, “em idade avançada”...
Quanto à tese do “descobrimento”, há uma interessante análise feita por
Francisco Contente Domingues, historiador, acadêmico da Universidade de Lisboa,
autor de “A travessia do mar oceano. A viagem de Duarte Pacheco Pereira ao
Brasil em 1498” [2012], segundo a qual, o mais
importante na discussão não se refere à “descoberta” feita por Duarte Pacheco,
mas ao fato de que ele teria passado pela costa brasileira e não teria visto o
que deveria, simplesmente, porque a visão que tinha de mundo àquela época não o
permitira, fato análogo teria ocorrido quanto à chegada de Cabral, já que os
indígenas nunca haviam visto uma caravela como aquelas do período das “grandes
navegações”, aliás, esse fato é amplamente explicado pela Mecânica Quântica. Da
mesma forma, pode-se perguntar: o teria pensado Duarte naquela viagem, quando
se deparou com aquela extensa e desconhecida terra?
No seu livro, “Esmeraldo de Situ Orbis”, Duarte Pacheco refere, mesmo que
sem muita clareza, que o rei D. Manuel o teria mandado descobrir “uma tão
grande terra firme a Ocidente do Atlântico”... embora seja essa tese pouco
convincente aos olhos de alguns, por ausência consistente de provas.
O historiador J. Barradas de Carvalho, historiador português, autor de
“La traduction espagnole du De Situ Orbis”,
em estudo sobre o famoso cartógrafo ressalta a importância da sua obra
para o do Renascimento português e entende como verídica e realizada a tese da
exploração chefiada por ele, cujo destino provável era mesmo a costa
brasileira, tendo passado além da linha definida no Tratado de Tordesilhas,
razão pela qual o “Esmeraldo” foi guardado por tantos anos.
Também na interpretação do historiador Jorge Couto, em seu livro “A
construção do Brasil”, dados ali registrados poderiam, sim, comprovar que
Duarte Pacheco Pereira realizou essa missão tendo atingido a costa brasileira
na região do Maranhão e foz do Amazonas, com a intenção de calcular a
localização do meridiano de Tordesilhas, se aproximando do litoral brasileiro,
que pertenceria à Espanha, o que não inviabiliza o fato de que tenha estado na
Bahia em suas andanças posteriores. Esse aspecto político-diplomático
explicaria o fato de o rei de Portugal ter escondido o feito e os resultados obtidos
pela expedição realizada pelo cartógrafo.
Muitas são as versões sobre a vida e a permanência de Duarte Pacheco no
Brasil, inclusive, de que teria, em aqui ficando, traficado africanos para
serem escravizados, sendo uma possível explicação para a fortuna que voltara a
acumular, já que a havia perdido por ocasião de sua prisão, mesmo que tivesse, ele e sua família, voltado a receber
dinheiro da coroa após a soltura... se é verdadeiro ou não, é muito difícil comprovar, mas também não
seria uma hipótese impossível, uma vez que o famoso personagem, como já
referido, caira em desgraça com a morte do rei D. Manuel, em 1521, e ascensão
de D. Jõao III.
Em 1490 figurava como membro
da guarda pessoal do Rei; em 1494 estava entre os representantes escolhidos por
D. João para negociar a fixação dos limites do Tratado de Tordesilhas. Apesar de tão questionado, uma das passagens mais
debatidas do Esmeraldo parece indicar a sua participação numa expedição enviada
por D. Manuel ao Atlântico Sul, em 1498, onde teria sido vislumbrada uma
considerável massa de terra firme, que seria o Brasil, cuja população indígena
do litoral é descrita, na obra, com detalhes: “… são pardos quase
brancos; e estas são gentes que habitam na terra do Brasil, de que já no
segundo capítulo do mesmo livro fizemos menção”.
Sua grande experiência náutica e cosmográfica o teriam
levado a participar de outras importantes expedições, com muitos êxitos, que
trouxeram considerável reconhecimento e consequente melhora na sua condição
social.
Por volta de 1508, teria começado a escrever o
Esmeraldo de Situ Orbis, precisando interromper, pois, entre 1509 e em 1510 fora
de novo convocado a servir a Coroa, no mar.
Em 1519, Duarte Pacheco Pereira voltou à África como
capitão da fortaleza de S. Jorge da Mina. No entanto, a morte do rei, em 1521, acabou
com esse rico período da vida e da carreira de Duarte Pacheco Pereira,
terminando em desgraça em conseqüência da nova conjuntura política que elevou
D. João III ao trono. Em 1522, Duarte foi aprisionado e encaminhado de volta ao
reino, com uma acusação pouco convincente, que culminou com a total perda de
seus bens.
Apesar de ter sido inocentado e posto em liberdade,
nunca mais ele conseguiu o prestígio anterior. Os problemas com a Coroa se prolongaram,
obrigando-o a lutar pela restituição dos seus bens e pelo pagamento “atempado
da tença” anual à qual tinha direito. Nessas
condições, ele chegou a se colocar à disposição para serviço do Imperador
Carlos V, chamado Imperador do Mundo (de Espanha e Alemanha), o que nunca se realizou.
Consta que viveu em Portugal até o final de sua vida, tendo falecido
em data desconhecida, entre os anos 1531 e 1533.
Porém, cabem aqui alguns questionamentos: um homem inteligente, dinâmico
e grande conhecedor dos segredos dos caminhos náuticos e dos Oceanos, e de tão
gandes conhecimentos de astrologia, conhecido pelos seus
feitos militares, mitificados pelos cronistas e cantados por poetas como Luís
de Camões, autor de uma obra inquestionavelmente importante para a navegação,
cujos quase exatos cálculos, até hoje não foram refutados, teria se conformado
em morrer na quase miséria e no ostracismo, podendo fazê-lo de forma totalmente
diferente e aventureira, como era da sua natureza? seus amplos conhecimentos o
teriam deixado conformado em casa, inútil, podendo voltar por conta própria,
apesar dos parcos recursos, a explorar o mundo, ou mesmo o Brasil e seu extenso
e luxuriante litoral, que não lhe era desconhecido?
Bem... que certeza se tem de que o Esmeraldo, cuja escrita
fora interrompida em 1508, teria mesmo ficando inacabado? a cópia conhecida e
registrada pela História, diz: “foi publicada pela primeira vez em 1892,
ficando, desde então, clara a sua importância como roteiro náutico e
geográfico, tratado cosmográfico e relato histórico, súmula do conhecimento
adquirido por Duarte Pacheco Pereira ao longo da sua existência”. Seria ela,
conhecendo-se sua importância, a única e verdadeira cópia se ele tivesse
voltado à aventura dos mares?
Será que Duarte, tendo conhecido a potencial grandeza
de tão misteriosa e rica terra, “uma tão grande terra firme”, nas atuais
circunstâncias, sem compromissos reais, a ignoraria? e mais, ele também esteve
em missão na África e conhecia os roteiros de navegação, e a situação econômica
dos habitantes da “Colônia” – o Brasil -, que precisavam de mão de obra barata
para o cultivo da cana de açúcar. Por que a hipótese não comprovada de que
tenha feito viagens para traficar pessoas para serem escravizadas pelos
fazendeiros seria tão inverossímil?
Outra não tão improvável seria a versão de que teria vivido no Recôncavo
Baiano e lá fundado, ele mesmo, um Engenho de cana-de-açúcar e deixado
descendentes...
Seriam essas convergências tão absurdas? absurda mesmo, seria a versão de
que tenha se conformado em viver no ostracismo e na miséria, podendo ter uma
vida extremamente aventureira, sedutora e lucrativa, no caso do Engenho, embora
esse pudesse ter sido um desdobramento ou consequência do possível tráfico de escravos.
Além de todas essas questões, tem o fato de ter sido tratado de forma injusta
pelo do rei e ficado inconformado em viver no esquecimento e sem condições
financeiras, depois de ter sido cantado nos versos de Camões...
Pesquisa realizada pela autora, para o romance "Cruz do meu rosário; um amor na Chapada", que, entretanto, foi excluída do mesmo.