domingo, abril 28, 2013

João de Deus de Castro Lobo (Guacira Maciel)

Estando a ouvir um programa musical na Cultura FM, como faço aos sábados a partir das sete horas, quando tudo ainda é silêncio, tive uma grata surpresa, que me deixou muito feliz. A cada programa uma personalidade da nossa cultura musical ( erudita) seleciona e conduz as apresentações ao público, e neste sábado foi a vez de Paulo Castagna, um musicólogo e professor que pesquisa a vida e a obra de João de Deus de Castro Lobo, àquela altura, um total desconhecido para mim. Foi uma surpresa atrás da outra, apesar de já vir estudando a Cultura de África há algum tempo e ter sido a primeira pessoa a trabalhar com a implantação da Lei 10.639/2003, como professora do Estado, no currículo da rede pública estadual da Bahia (Educação Básica), e ser sua representante junto à Secretaria Estadual de Direitos Humanos na primeira proposta de inclusão dessa e de outras Culturas na Educação Básica, neste caso,  na perspectiva das Políticas Públicas.
Em 16 de março de 1794 nascia, em Minas Gerais, um menino negro, que viria a ser um grande expoente da música sacra no Brasil. Aos 17 anos apresentou-se à frente de dezesseis músicos na temporada da Casa da Ópera de Vila Rica, passando a ser membro da Irmandade de Santa Cecília, que reuniu os profissionais atuantes na Capitania de Minas Gerais. Àquela época, só havia música sacra na Bahia, Minas Gerais e Rio de Janeiro, e apenas feita por descendentes de africanos; era uma música com feições europeias e não eminentemente africana, o que "só acontecia em festas de expressão popular", quando as partituras eram (bem) vendidas em lojas de variedades.
A partir de 1817 o compositor começa a atuar como organista da Ordem 3ª de Nossa Senhora do Carmo, a mais influente de todas as irmandades de Vila Rica, apesar de as Ordens 3ª do Carmo só aceitarem homens brancos  A atuação de João de Deus junto ao Carmo durou até 1823. Nesse mesmo período o compositor concluiu seus estudos de latim; em 1819 e no ano seguinte foi admitido no Seminário de Mariana. João de Deus rompeu com paradigmas e preconceitos, ordenando-se padre (primeiro padre negro do Brasil) em 1822. Ainda nesse ano, a Ordem 3° do Carmo paga ao compositor a importância de $22,100 pela composição de um “Te Deum” para Sua Alteza Real, D. Pedro I, durante sua histórica visita à Vila Rica. No ano seguinte, atua como organista na igreja do Carmo, antes de transferir-se definitivamente para Mariana onde, em 1825, o encontramos já ligado à Ordem 3ª de São Francisco da Penitência de Mariana. No período em que viveu em Mariana, certamente atuou também como mestre-de-capela, pois, embora não tenhamos o documento de sua nomeação, essa atividade e título eram exclusivas das sedes de bispado, de acordo com a tradição luso-brasileira.
Em 1831, o compositor começa a trabalhar na sua última obra, os “Responsórios Fúnebres”, que ficaram incompletos devido ao seu falecimento precoce em 27 de janeiro de 1832. O Padre João de Deus foi um homem que rompeu com muitos paradigmas também na vida, tendo sido acusado de concubinato; morreu de sífilis aos 38 anos, “provavelmente acompanhada de tuberculose”, razão pela qual nada da sua obra tenha sido preservada, já que foi toda queimada para evitar o contágio. Quem preservou o acervo dele (e de outros compositores) foi a população mineira. Até agora Paulo Castagna encontrou 750 manuscritos em 25 acervos, restando ainda muito a ser pesquisado.

terça-feira, abril 23, 2013

Dieta? EU??



     Mas a principal recomendação é esta: FUNDAMENTAL AMAR-SE!


 _ Aconteceu!...sempre fui magérrima! tão magra, que quando era criança/adolescente, minha mãe não permitia que vestisse calças compridas, porque achava que eu ficava com aspecto de doente...imagine isso hoje...
_ Mas você não está gorda! qual é a sua altura?
_ Tenho 1,63cm e tenho consciência de que estou com um excesso de 9kg, minha querida...
_ Ah!... você tira isso de letra...come pouco...
_ Nada! não é tão fácil para alguem que nunca, nunca ao menos pensou em deixar de satisfazer todos os desejos gastronômicos. Adorava, e devorava, embora em pouca quantidade, porque sempre comi pouco, docinhos, tortas, frituras, refri, tuuudo o que passava à minha frente, quase de meia em meia hora! estava sempre faminta! rsrs
_ Mas também sempre foi muito ativa e devia metabolizar todos os venenos com rapidez tão grande que nem chegavam a fazer mal.

    Estava lembrando dessa conversa, tida com uma amiga, não faz muito tempo...aliás, há três meses, para ser mais precisa. O que aconteceu, refleti, é que estava com a auto estima tão baixa, tão baixa!...não sentia prazer em nada; nada era interessante em minha vida nesses ultimos anos vividos com um homem que me sempre me pareceu tão doce (hoje eu sei que só enxergava nele o que eu queria, o que me dava a ilusão de estar feliz...); mas, ultimos anos? não! foram quase 11 anos...foi um processo tão lento, embora doloroso,  que eu nem percebia com clareza o quanto estava me deixando destruir interiormente, estava destruindo minha alma, minha sensibilidade...você e seu egoismo, salvo os primeiros cinco ou seis anos, foram devastadores, conseguiram desequilibrar meu tônus emocional de forma inimaginável à quem me conheceu antes de você entrar em minha vida, de forma tão compulsária...mas nada nos acontece sem que permitamos que assim o seja. Fui eu quem permitiu que fizesse isso comigo, mas eu sempre acreditei que aquele amor adolescente havia retornado, como nos romances, para ficar para sempre... sua voz me aquecia como aquela lareira acesa em noites frias de inverno, cuja chama quentinha agasalhava até a alma...eu tinha certeza que seria para sempre, porque não existem acasos; você não voltara sem razão nenhuma após tantos anos...jamais imaginei que me faria sofrer, e tão profundamente. Jamais imaginei, na minha ingenuidade, que poderia me causar algum mal...

_ Mas, amiga, se você chegar a ler este post, saiba que fiz a melhor de todas as dietas...estou livre! o amor não pode fazer sofrer; não é uma fatalidade em nossa vida; ele não pode nos fazer adoecer...inesperadamente tive um encontro comigo mesma desde esses três meses que mencionei; foi uma surpresa maravilhosa; olhei para os lados e ele já não estava lá, ao meu lado, como uma sombra ou uma assombração (risos). Estou bem, emagreci  5kg facilmente, sem sofrimentos; os 4 ou 5 kg restantes, vai ser moleza, porque não sofro por ter me afastado do que me fez tanto mal, já que o que me fez isso não foi o que eu comia, mas o que me fazia comer... agora tomei de volta o timão; .faço exercícios diários e, embora continue comendo pouco, abandonei tudo o que não me dava nada de bom. Passei a comer frutas deliciosas cujo néctar escorre da minha boca macia e brandamente; verduras e legumes muito bem temperados com com gengibre e alho fatiados no azeite, manjericão...um manjar que vem diretamente da mãe Natureza, e uma boa mãe não maltrata. Mas o melhor de tudo, um bálsamo entrou delicadamente em minha vida e ela se renova, se refaz, como se eu estivesse sendo gestada outra vez para um novo encontro...

Olhei o mar colorido naquele tom laranja compulsório do ocaso,  que gestava em suas águas férteis e mornas uma nova noite, como ante sala de um outro amanhecer...

PS. Amiga, se chegar a ler isto que escrevi, retorne postando um comentário e saberei que lembrou daquela nossa ultima conversa.  Beijo.

sábado, abril 13, 2013

A mulher na Literatura Brasileira a partir do século XIX; fragmento de proposta de pesquisa... (Guacira Maciel)

A relação entre Literatura e Memória remonta aos primórdios da história humana, quando a cultura e a educação gregas se apoiavam na declamação para preservar e difundir as práticas. Nesse período, existia apenas a poiesis, que desempenhava o fundamental papel de contar a história; ainda não se falava em literatura. Dessa forma, o que havia era um encontro que enfatizava estreitas relações entre lembrar (memória) e narrar (literatura).
As interferências de âmbito social na literatura, geralmente, eram relegadas a um segundo plano, o que terminava por empalidecer a importância dos aspectos sociais das experiências humanas em determinados contextos. Assim, ainda que alguns elementos de uma obra literária sobrevivessem numa zona de sombra, terminavam por criar espaços espontâneos de interação entre o autor, a subjetividade e o leitor. Os textos literários eram, a priori, analisados sob pontos de vista artísticos, criando um vácuo sócio histórico na literatura,  e mesmo que a experiência social e os hábitos dos sujeitos estivessem presentes de forma subjacente em todas as manifestações no contexto da obra, assim como no contexto da vida dos autores e dos leitores, essas análises não eram consideradas.
Por esta razão, foi (e continua sendo) interessante desvendar esses caminhos de participação da mulher no universo literário, já que sua atuação ali, embora riquíssima, era mais ignorada, quanto mais atuante ela se tornava, chegando  à proposital invisibilidade em determinada fase; e nesse entre espaço onde tinha uma sub vida, nesse “entre lugar”,  ela gestou e deu crias, já que, em sendo invisível, ele não tinha fronteiras limitadas... aí ela se fortaleceu, num processo de retroalimentação, até tornar-se um grupo de mulheres escritoras fortes, conscientes e que tinham muito o que dizer. Conhecer sua trajetória desde os primórdios de sua atuação e o papel desempenhado pela imprensa feminina brasileira do século XIX, como suporte à mudança do paradigma que aprisionava a mulher como propriedade masculina, assim como o que veio a mudar nessa relação e na sua atuação na sociedade como um todo, é fascinante...
Alguns autores vêm discutindo essa questão, interessados na escritura jornalística feita por mulheres, indagando-se sobre o que pensavam, sentiam e escreviam no período em questão, como um marco para as mudanças decisivas que terminaram por atingir as bases da sociedade no “rastro das grandes mutações político-econômico-sociais que se aceleraram no século XX”, assim como das profundas modificações ocorridas nas relações homem-mulher e, consequentemente, na família e na sociedade. Os documentos que registram essas experiências do passado, vêm sendo redescobertos ou reanalisados sob outras perspectivas, podendo-se considerar que o fenômeno reabre as discussões sobre essa questão, em específico, e sobre linguagens outras, que ainda hoje aquecem as opiniões sobre o estar da mulher em sociedade.
Numa entrevista à Revista “ISTO É”, Mary del Priore, uma importante pesquisadora, brasileira,  contemporânea, do assunto, diz que o “feminismo no Brasil não funcionou porque as mulheres continuam a pensar de forma arcaica. Há ainda aquelas que cultivam o mito da virilidade, gostando de evidenciar a sua fragilidade”, numa profunda e inadmissível auto desvalorização. Segundo ela, as discussões em alguns países trouxeram como proposta para o século XXI uma nova ética para a mulher, fundamentada em valores absolutamente femininos, que divergem do pensamento de Simone de Beauvoir (anos 50), de que o objetivo das mulheres seria provar que eram iguais ao homem podendo assim, se beneficiarem dos mesmos direitos, os masculinos. Entretanto, a compreensão á a de que esses objetivos são “abstratos e vazios”, por não terem considerado as diferenças entre os gêneros, para lutar contra a submissão. A mulher não tem que partir de valores masculinos para lutar contra isso, mas dos seus próprios valores, na busca de mudanças e novos paradigmas em que ela esteja em seu próprio lugar, antes de tudo, como sujeito de direito. O cerne dessa nova ótica não é adotar os valores masculinos, mas refletir uma ética e uma lógica em que sejam identificados e respeitados os valores femininos, estando, entre outros: a “liberdade individual, controle do hedonismo e dos desejos, e contornar o vazio da pós-modernidade”. Percebendo-se que no século XXI a busca é pela felicidade e por identificar e definir identidades, tendo como pressupostos, educação e consciência, ou seja, uma consciência muito mais profunda e ampla.

A autora Norma Telles, em sua obra, Rebeldes, escritoras abolicionistas, nos refere que na sociedade oitocentista a criação seria um dom exclusivamente masculino e que [para a mulher] o livro era a almofada e o bastidor, e mais, que é necessário rebeldia e desobediência aos códigos culturais vigentes. Há pouco tempo, numa novela que retratava o início da República no Brasil, vimos que uma mulher, mesmo sendo competente jornalista precisava usar um pseudônimo masculino para publicar num jornal, seus artigos de excelente qualidade. Ainda da autora supracitada: o “ato de escrever implica numa revisão do processo de socialização, assim como das representações conscientes e em enfrentamentos do inconsciente, também ele invadido pela situação objetiva da dependência do homem, que condicionaram a formação do eu”. Sem dúvida, essa é uma questão que merece um debate mais aprofundado por se tratar de identidade, me refiro a uma dimensão muito além da condição de ser do gênero biológico ao qual pertence, falo do ser feminino na mulher contemporânea, que se aloja na sua mais íntima condição de sujeito  individual, entendido sob nuances novas, e aquele que sobreviveu do período acima referido, tanto individual, quanto coletivo, implicitamente instalado e aceito naquela sociedade, que terminou por ser internalizado, vindo a compor o inconsciente coletivo, uma vez que a memória individual alimenta-se deste ultimo e que o ato de lembrar não é autônomo, estando enraizado no movimento interpessoal das instituições sociais. Essas ‘fronteiras’ e esses movimentos terminaram por denunciar abismos que foram corajosa e sub-repticiamente explorados, desmistificados no submerso universo feminino em qualquer instância, notadamente o da literatura, nosso foco aqui, mas que se desdobraram em muitas esquinas que apontaram infindáveis caminhos e formas de caminhar [...]