segunda-feira, março 08, 2010

Contrapondo... (guacira maciel)

(Este é parte do prólogo do meu próximo livro:A Importância da Arte na Aprendizagem, em fase final de revisão)

Meu trabalho, aqui exposto, é apenas um sussurro, embora ousado ao escapar da meia-voz...Uma transgressão fortalecida pela compreensão, entre outras experiências, do que li em um prefácio, e ouvi pessoalmente de Edgar Morin numa conferência:

"Acredito que nos tornamos intelectuais quando enfrentamos problemas humanos, morais, filosóficos, sociais, de forma não especializada [...]É preciso ter coragem intelectual"


O desejo não é o de entrar para o ‘seleto rol dos intelectuais’, mas o de poder me expressar sem que esteja ‘infligindo alguma lei do olimpo’, ou que o que digo aqui seja considerado um delírio. No presente é fundamental discutir a permanência da centralidade na ciência acadêmica como único caminho, assim como de seus métodos, sem diálogo com as percepções que levam por outros caminhos e respectivas comprovações. Este livro é o resultado do enfrentamento cotidiano de problemas humanos e, consequentemente, sociais, em anos e anos atuando na educação. Existirá problema mais humano e social que este?
Qualquer projeto de Educação precisa estar aberto aos questionamentos e às possibilidades do novo em todas as dimensões; em sendo assim, trago à discussão a percepção de que, como proposta de superação da fragmentação disciplinar, a Arte se constitui um riquíssimo e amplo caminho para ajudar a compreensão da possibilidade de expansão das idéias e do pensamento, na busca de evitar que os sujeitos, alvo dos sistemas, se tornem indecisos, frágeis e inconsistentes, para se tornarem libertos e “errantes”, na perspectiva de acolher essa possibilidade, e não uma verdade endurecida e única, comprovada e eternizada por uma ‘elite de pensadores’. Aliás, o próprio caminho é que deverá se constituir o objeto e o objetivo da proposta de educação para o momento em que estamos vivendo e para o que advirá, doravante sem condição de previsibilidade alguma. Precisamos nos colocar na condição de viajantes e observar que a paisagem muda à medida que caminhamos, apresentando novas exigências e que é preciso estar atentos, porque essa passagem nos acrescenta aprendizagens novas e outras formas de olhar, necessitando que mudemos a direção e observemos sob outras perspectivas. Isso ensina ao viajante.
Existem nuances do conhecimento que a ciência não explica, ou seja, não há como determinar que só é ciência o que a razão e o método explicam - mesmo porque os outros caminhos também têm sua lógica, sua filosofia e suas ‘razões’ - é imprescindível dialogar com a subjetividade e suas possibilidades; com os caminhos que só o são depois da passagem do viajante; aqueles que margeiam as ‘autopistas’, que acontecem de forma autodidata; além da própria Filosofia, porque somos sujeitos da história antes de tudo e essa se constitui uma condição primeira, uma condição antecedente, uma vez que temos experiências humanas comprováveis.
Sinto muita insatisfação, uma espécie de comichão, de inquietude muito apaixonada quando percebo o encaminhamento dessas questões com um determinismo que encerra a condição humana de extrapolar os cânones, as bitolas acadêmicas e o cientificismo, muitas vezes bastante estreitos, porque a vida é um arcabouço a ser preenchido quando percorridos os possíveis caminhos, e os sujeitos em suas vivências têm formas diferentes de caminhar, inclusive porque uma minoria não pode ditar regras para a multidão, nem encerrar o saber entre grades, se a cada segundo outras e outras formas diferentes se nos apresentam como possibilidade e se vão incorporando às identidades humanas, cuja porta precisará permanecer sempre entreaberta.
Nós, professores, precisamos nos desencaminhar; como viajantes precisamos observar o traçado dos 'cruzamentos', ou das 'encruzilhadas', como outras possíveis formas, criando elas mesmas uma nova retórica, sem essa institucionalização dos sistemas, que emperra, que endurece, que constrói grades, vindo a reinstalar uma ciência que no passado já percorreu um caminho único. É preciso lembrar que a (re)organização do cosmo partiu da sua própria desintegração; do caos. Então, propostas de políticas para uma educação que faça sentido, que tenha significado para a juventude só poderá ocorrer se percebermos a necessidade e tivermos a coragem e a força interior de desconstruir, de fazer ruir esse amontoado de propostas, e programas paliativos, sem consciência, compensatórios, emergenciais e inconsistentes, porque pouco profundos e filhos da falta de reflexão.
No pensamento de Jacques Derrida, ícone da teoria da abordagem Pós modernista, na Teoria das Organizações (TO), uma desconstrução que se fundamente no modo de construção original pode revelar significados ocultos, ou seja, possibilitar a construção de uma outra verdade/interpretação, ainda que temporária, que encaminhe para a pluralidade de discursos e conseqüente disseminação dessa outra 'verdade'.
A institucionalização, ou racionalidade com que impregnamos os instrumentos/sistemas, levam ao “aprisionamento das ações sociais, acabando por se refletir na concepção de justiça”.

Vem ocorrendo, de forma recorrente, uma situação que considero gravíssima nas nossas escolas brasileiras, como conseqüência da falta de conhecimento, compreensão dessa outra verdade/interpretação, e reflexão sobre as questões sociais, terminando por inviabilizar que a oferta de educação aconteça de forma irrestrita. Assim, as escolas se tornam reféns da institucionalização irracional dos sistemas. Aliás, a educação termina por se constituir uma oferta por força de lei, e não um direito anterior; o direito humano a educar-se.

E me veio ao pensamento Cecília Meireles:
“Renova-te.
Renasce em ti mesmo
Multiplica os teus olhos
para verem mais”.

Nenhum comentário: