Monica Waldvogel entrevistava a
escritora, de livros infantis, Patrícia Secco acerca de um projeto financiado
pelo Ministério da Cultura, em que ela e editores de “muita experiência” fariam
o seguinte: a adaptação dos clássicos da nossa Literatura, mais especificamente,
ninguém menos que Machado de Assis, começando com o conto, O alienista, e
outras obras, como: A pata da gazela, José de Alencar; Memórias de um sargento
de milícias, Manuel Antonio de Almeida, e O cortiço de Aluísio de Azevedo, para
“facilitar o acesso ao textos”, entre outros absurdos dessa ordem.
A justificativa para tal
sacrilégio inclui vários motivos, estando entre eles: a “formação de
leitores”, pois o brasileiro não lê; “a democratização da obra de Machado”,
pois “o vocabulário do século IX exige esforço do leitor”; “levar Machado a
quem não conhece”, entre outras heresias...No programa a autora chega a dizer
que isso evitaria que o leitor ficasse “derrapando no boticário, achando que é
uma marca de cosmético”...o que achei desrespeitoso para com os que não fazem
parte das elites eruditas, como alguns escritores se entendem...
Na mesma entrevista, Monica Waldvogel
colhe opiniões, estando entre elas a do escritor Ronaldo Bressane ( que não
conheço, sendo sincera), que disse: “é melhor ler meio Machado do que
nenhum”... Mas tem também a opinião, ao vivo, do conhecido estudioso, poeta e Professor do Curso de Letras da USP,
Alcides Villaça, que, tendo lido toda a “versão facilitada”, declara sua
indignação sobre a questão, dizendo que aquela modificação dá num “monstrengo
cultural”, pois o “discurso narrativo tão próprio de Machado foi alterado,
assim como seu ritmo, sintaxe, pontuação, tudo da maior importância na
narrativa, até a afetividade” impressa no texto, em que suprimem, cortam e
juntam períodos tirando o sentido do que foi dito pelo autor; pode-se ler “coisas
que Machado jamais faria”, terminando por dizer que na adaptação “há trextos
incompreensíveis”, é “grosseira, é crime, para se jogar no lixo”. Querem facilitar o acesso? Aceitem a sugestão
do Professor Alcides Villaça,
democratizem fazendo cópias disponibilizadas pela própria Academia Brasileira
de Letras, entre outros sites sérios.
Essa equipe chega ao cúmulo de
retirar a pontuação do autor, como o ponto e vírgula, uma das suas marcas,
substituindo por ponto final (que não têm a mesma função), juntando
parágrafos ou suprimindo outros, o que
descaracteriza a escrita de Machado.
Bem, como Professora, Educadora e
Bibliotecária, que trabalha com formação de leitores em colégio público, sou
veementemente contra esse projeto sem sentido, estapafúrdio, de quem parece não
ter ideias melhores para ajudar a população a ler. As novas gerações têm o
direito de conhecer a linguagem erudita, têm o direito de conhecer a Literatura
Clássica do seu país, que representa a vida do seu povo e, inclusive, a
História da Literatura, da Arte Literária desse povo, que através desse projeto
está sendo suprimida da suas vidas; estão retirando o seu direito de conhecer,
na íntegra, a obra de grandes autores da Literatura Brasileira. Uma fala que me
deixou muito indignada foi a autora, Patricia Secco, falar que apenas fez uma
“transposição da linguagem do século IX para a linguagem atual”...então, a
juventude não tem direito a conhecer o contexto em que a obra desse
gênio foi escrita? Então, é isso, nós, Educadores, falamos e nos esganamos para
situar o conhecimento no contexto de vida das pessoas, usando um importante
Princípio Pedagógico que facilita a compreensão do estudante, que é a
Contextualização, e um grupinho de pessoas, autores e editores, se revestem de
uma autoridade outorgada pelo Ministério da Cultura, que financiou esse
“Projeto” de desconstrução, no valor de 1,5 milhão, para destruir tudo?
Percebo que os jovens oriundos de populações
desfavorecidas por um bom Projeto de Educação Pública e Privada, também, têm avidez por saber, pelo conhecimento,
avidez de ler, eles adoram ir à Biblioteca me pedir para indicar livros para
lerem, e depois retornam para os comentários, para discutir sobre o que
entenderam da obra, fazem comparações entre os personagens e o contexto de suas
próprias experiências de vida, da forma mais bonita e inesperada...Entretanto, não
chegam verbas específicas e direcionadas para a aquisição de livros, para atualizar
e prover os acervos das Bibliotecas das escolas...É assim que se deveria usar
as verbas gastas com projetinhos de simplificação da obra dos nossos autores clássicos,
por entenderem alguns que as pessoas das classes populares iriam confundir
“boticário com cosméticos”. Eu, pessoalmente, venho pedindo às Editoras que
doem livros de Literatura para que esses jovens tenham mais ofertas, mais
possibilidades...a isso eu chamo “democratização dos textos literários”. O
senhor Ronaldo Bressane disse que as “pessoas talvez não entendam o vocabulário
de Machado”...e eu acho essa declaração uma grande bobagem! Ele nada sabe
dessas pessoas, assim como editores, que querem vender livros para o Governo, e
todos os que estão preocupados em ter projetos de má qualidade financiados com
o dinheiro público! Eles não têm autoridade para suprimir da vida de gerações inteiras o conhecimento, na íntegra, da obra de um autor tão importante da nossa História Literária.
Querem “facilitar o acesso ao
texto”? Aceitem a sugestão do Professor
Alcides Villaça, democratizem fazendo cópias disponibilizadas pela
própria Academia Brasileira de Letras, entre outros sites sérios.
Tem um abaixo assinado contra
esse “projeto” circulando por ai, se o encontrarem, peço que assinem. Obrigada.
Obs. A entrevista completa está
no link do Globo Literatura.