segunda-feira, agosto 28, 2006

Sonho da Chapada (guacira maciel)

Julho - 2005
Um dos meus mais acalentados sonhos era conhecer a Chapada Diamantina, porque desde muito pequena ouvia histórias fantásticas sobre a região, contadas por meu pai, que era de lá, e tinha um excepcional talento como narrador. Já havia quase desistido, quando meu psicanalista predileto fez O Convite...quase não acreditei! Daí em diante foram só planos; faltavam ainda 15 dias para a tão esperada caminhada - a proposta era essa: caminhar na Chapada - e eu já não conseguia dormir...Comecei a preparar roupas apropriadas, porque nesta época do ano aquela região, como de resto todo o interior da Bahia, é muito frio; era julho. Claro que nada disse ao realizador do meu sonho, porque ele poderia me achar muito ansiosa e estressada, coisas assim...sabe como são os psicanalistas, não? começam logo a enxergar um monte de paranóia na gente!
O grupo era composto de pessoas que eu não conhecia e isso foi surpreendentemente rico e prazeroso; houve uma sintonia absoluta, imagino até, que muito favorecida pelo próprio astral do lugar, em que o homem se integra ao seu habitat /gênese; a natureza. Engraçado observar o quanto somos afetados por essas coisas; o quanto mudamos nosso comportamento e nos tornamos mais humanos em ambientes mais ligados à natureza e desligados do nosso cotidiano desesperador vivido na urbanidade... Sem dúvida, por ser essa a nossa essência, a nossa natureza verdadeira.
Jamais vou poder esquecer esses dias, ainda que lá volte muitas vezes. Na verdade, existem momentos únicos na vida da gente; momentos irrepetíveis (podem acontecer outros até melhores); como se um portal se abrisse no Universo para nos dar de presente a magia que só pode ser percebida se estivermos muito atentos para pegá-la no ar, naquele exato momento!
Nunca pensei em praticar uma caminhada tão radical; escalei pedras que tinham três vezes a minha altura; pulei sobre formações rochosas, sob cachoeiras, que tinham verdadeiros abismos líquidos entre si; levei uma queda caindo dentro de um buraco arenoso, que me deixou as costas feridas e doloridas por dias após retornar. Porém nada disso foi mais importante do que viver aquela experiência.
Trouxe de lá guardados importantes, que, passados mais de quatro anos, ainda me alimentam; me levam a reavaliar algumas coisas...uma consequência deles é este poema que aqui vai, como resultado das minhas observações, da paisagem e sua velhíssima história, contada pelo nosso interessante e sádico guia, a quem apelidei de Fred Krueger (deu pra entender? rsrs), um verdadeiro compêndio da história, da geografia e da biologia da região, além das relações com alguém muito especial:

PEDRA DE FOZ

És como o grande abraço antisséptico
das imponentes pedras de foz
presença forte de eternas guardiãs
que são começo
mas também limites
tens imutável e frio o olhar
embora invejoso
sobre os seixos que rolam sensuais uns sobre os outros
ao sabor do vai e vem das correntes
as pequenas pedras que se deixam envolver
nesse aconchego
nem por isso brilham menos
mas não te sinto a grande rocha fria
tens o não assumido íntimo
louco pelo abraço
pelo perder-se do sujeito
e misturar-se na inconsistente massa
se deixar lamber
e se deixar levar pelo canto úmido das águas
e conhecer seu leito.

2 comentários:

Adriana Braitt disse...

Fiz parte deste sonho e me sinto muito feliz por ter te conhecido. Você é alguém especial, autêntica, sensível... foi bacana demais subir pedra por pedra... escorregar... lembra? Sentir a água fria e a pedra nos pé, uma sensação de vida e de perceber a simplicidades das coisas. Que saudade!!! Vamos voltar lá? Um grande abraço,
Adriana Braitt

Guacira Maciel disse...

Lógico, querida! tudo se integrou ao meu sonho...
vc me vê com os olhos que põe sobre a vida e as pessoas; logo, especial é você.
Podemos voltar lá, sim, e será sempre maravilhoso (para aquele exato momento). Coisas especiais não se repetem; são únicas; a magia está, exatamente, nisso!
Obrigada por sua amizade e por ser quem é.
Beijos, Guaci.